domingo, 19 de janeiro de 2025

Auto da Compadecida


 INGRED MACIEL TARGINO 


"O Auto da Compadecida"(2000), dirigido por Guel Arraes e baseado na peça homônima de Ariano Suassuna, é uma adaptação que mescla elementos de comédia e drama num cenário de escassez e esperança. O filme conta a história de dois personagens principais: João Grilo (Matheus Nachtergaele), um jovem pobre muito astuto e ambicioso, e Chicó (Selton Mello), um mentiroso medroso. Inconformados com a realidade que vivem, os atrapalhados amigos desenvolvem um plano para enganar os moradores da sua cidade, mas tudo se complica quando um grupo de cangaceiros invade a cidade. Juntos, enfrentam uma série de situações inusitadas, inclusive uma intervenção divina. 

O grande trunfo do filme é a forma como ele liga elementos da cultura nordestina a temas universais, como a luta pela sobrevivência e a dualidade entre o bem e o mal. A trama é uma epopeia desengonçada e carismática, que cativa e diverte o espectador. Como se é de esperar, o roteiro é recheado de diálogos rápidos e engraçados que proporcionam ao público risos constantes, traços típicos da escrita de Ariano. Ele utiliza o humor para abordar também questões profundas, como a corrupção, a fé, a moralidade e as relações humanas, sem perder a leveza. 

A interpretação do elenco é outro ponto alto. Matheus Nachtergaele e Selton Mello entregam performances memoráveis como João Grilo e Chicó, sem falar da grande Fernanda Montenegro e sua interpretação de Nossa Senhora. No entanto, a obra também peca, em alguns momentos, pela superexposição de alguns estereótipos e pela rapidez com que certas tramas se resolvem. 

Ainda assim, "O Auto da Compadecida" tem seu valor cultural e artístico reconhecido, sendo uma das grandes obras do cinema brasileiro. Ao apresentar personagens complexos e uma narrativa que atravessa o folclore e a religião popular, o filme se torna uma obra que encanta, diverte e gera reflexões de forma leve. A obra, no final, é uma verdadeira celebração da esperteza e da fé popular, com o nordestino sendo apresentado como um ser resiliente e espiritualmente forte, que se reinventa diante das adversidades da vida.

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