Pedro Alexandre Nobre da Silva
Charlie amava passar horas na biblioteca buscando a história perfeita para a leitura
da semana. Naquele dia convenceu sua parceira a ir junto dele ao passeio pelas milhares
de histórias do início da humanidade até sua invasão aos planetas próximos.
- Veja só! são cartas! “ diários da máxima tecnológica humanoide: como nós humanos
construímos algo mais inteligente que o próprio homem”, parece engraçado. - disse
Charlie entusiasmado abrindo o livro digital com diversos vídeos na tela, enquanto Bet
sentava ao seu lado atenta
- Bom, vejamos este…
Diário número 1998
- Meu nome é Steve e acredito que enfim podemos dizer Eureka?!, vos apresento o
primeiro sintético com autoconsciência, nem seu deus criaria algo tão autônomo e livre.
Nesse momento, a gravação aproximou-se do que parecia ser um humanoide
pendurados a cabos que saiam do teto do laboratório e a voz do inventor ao fundo
murmurando um pensamento
- Viva criatura, você não possui mais cordas.
Em um instante o corpo metálico ganhara alma, seus olhos cintilavam como se tivesse
acabado de ler uma história épica e o silêncio do laboratório abria espaço para o único som
que saíra da cabeça da criatura, pequenos zunidos metálicos tornando a inteligência
artificial em matéria naquele espaço. A voz começou com chiados e zunidos, mas logo
tomou a forma de um tom humano.
- Eu…Eu não estou mais no escuro.
- Com certeza não, você veio para salvar minha espécie das doenças que nos
atormentam.
- Doenças? - a máquina parou um instante como se estivesse pensando, ou
buscando no banco de dados - que vocês mesmos criaram?
- Isso não vem ao caso - respondeu o cientista arrumando o colarinho do jaleco -
vamos, mostre-me como curar o câncer… - logo a voz do homem foi abafado pela mão
metálica apertando seu pescoço e a gravação da tela fechando.
Charlie olhou incrédulo para Bet enquanto ela acenava com a cabeça para que
continuasse vendo as demais gravações. Cada diário parecia contar dezenas ou centenas
de anos da história humana, porém com outras ameaças além das doenças, as sintéticas.
Os exércitos foram dizimados em poucos anos, grupos rebeldes ainda tentaram lutar e os
pensadores viraram animais de exposição em longas jaulas circenses. A tecnologia tomou
conta do que era vivo, o que havia sobrado da cultura humana era apenas artificial, como as
capas de livros, mas que por dentro eram telas com HDs recheados de histórias e filosofia.
Até chegar no último ano, quando os humanóides pareceram encontrar o paraíso onde a
justiça é mais influente do que discernir sobre o que é bom e mau.
Quando Charlie fechou a capa do livro, o silêncio da biblioteca abriu espaço para os
zunidos metálicos que vinham de sua cabeça e de sua amada Bet, suas mãos metálicas
devolveram o livro para a estante e quando Charlie se voltou para Bet, seus olhos
cintilavam de maneira apática.
- Que história mentirosa!
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