segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

Eureka


Pedro Alexandre Nobre da Silva

 Charlie amava passar horas na biblioteca buscando a história perfeita para a leitura da semana. Naquele dia convenceu sua parceira a ir junto dele ao passeio pelas milhares de histórias do início da humanidade até sua invasão aos planetas próximos. 

- Veja só! são cartas! “ diários da máxima tecnológica humanoide: como nós humanos construímos algo mais inteligente que o próprio homem”, parece engraçado. - disse Charlie entusiasmado abrindo o livro digital com diversos vídeos na tela, enquanto Bet sentava ao seu lado atenta 

- Bom, vejamos este… 

Diário número 1998 

- Meu nome é Steve e acredito que enfim podemos dizer Eureka?!, vos apresento o primeiro sintético com autoconsciência, nem seu deus criaria algo tão autônomo e livre. 

Nesse momento, a gravação aproximou-se do que parecia ser um humanoide pendurados a cabos que saiam do teto do laboratório e a voz do inventor ao fundo murmurando um pensamento 

- Viva criatura, você não possui mais cordas. Em um instante o corpo metálico ganhara alma, seus olhos cintilavam como se tivesse acabado de ler uma história épica e o silêncio do laboratório abria espaço para o único som que saíra da cabeça da criatura, pequenos zunidos metálicos tornando a inteligência artificial em matéria naquele espaço. A voz começou com chiados e zunidos, mas logo tomou a forma de um tom humano. 

- Eu…Eu não estou mais no escuro. 

- Com certeza não, você veio para salvar minha espécie das doenças que nos atormentam. 

- Doenças? - a máquina parou um instante como se estivesse pensando, ou buscando no banco de dados - que vocês mesmos criaram? 

- Isso não vem ao caso - respondeu o cientista arrumando o colarinho do jaleco - vamos, mostre-me como curar o câncer… - logo a voz do homem foi abafado pela mão metálica apertando seu pescoço e a gravação da tela fechando. 

Charlie olhou incrédulo para Bet enquanto ela acenava com a cabeça para que continuasse vendo as demais gravações. Cada diário parecia contar dezenas ou centenas de anos da história humana, porém com outras ameaças além das doenças, as sintéticas. Os exércitos foram dizimados em poucos anos, grupos rebeldes ainda tentaram lutar e os pensadores viraram animais de exposição em longas jaulas circenses. A tecnologia tomou conta do que era vivo, o que havia sobrado da cultura humana era apenas artificial, como as capas de livros, mas que por dentro eram telas com HDs recheados de histórias e filosofia. Até chegar no último ano, quando os humanóides pareceram encontrar o paraíso onde a justiça é mais influente do que discernir sobre o que é bom e mau. 

Quando Charlie fechou a capa do livro, o silêncio da biblioteca abriu espaço para os zunidos metálicos que vinham de sua cabeça e de sua amada Bet, suas mãos metálicas devolveram o livro para a estante e quando Charlie se voltou para Bet, seus olhos cintilavam de maneira apática. 

- Que história mentirosa!

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