quarta-feira, 28 de agosto de 2024

Jogos e destino


MARIA FERNANDA BACALHAU SILVA


A vida é um grande tabuleiro, onde cada um de nós é uma peça em movimento. A ludosofia, essa arte de entender o mundo através dos jogos, nos revela que a existência não é apenas sobre vencer ou perder, mas sobre como jogamos as partidas que nos são dadas. Em cada escolha, movemos nosso peão um passo à frente, sem saber ao certo o que nos espera na próxima casa.

As regras da vida são como as regras de um jogo: às vezes rígidas, às vezes flexíveis, sempre desafiadoras. Elas nos obrigam a pensar, a planejar, a arriscar. E como num jogo de xadrez, cada decisão é uma aposta, cada movimento, uma estratégia. Mas o tabuleiro da vida é imprevisível; o dado rola, e o resultado é incerto. A ludosofia nos ensina a abraçar essa incerteza, a entender que o acaso faz parte da magia do jogo.

Nos momentos de vitória, saboreamos a doce sensação de ter feito a jogada certa, de ter previsto os movimentos do adversário. Mas nas derrotas, é onde crescemos de verdade. Perder uma partida é a oportunidade de aprender, de reavaliar nossas estratégias, de nos preparar para o próximo desafio. E assim, o ciclo continua: jogamos, ganhamos, perdemos, e jogamos novamente.

A ludosofia, então, é a sabedoria que nos lembra que a vida é, em sua essência, um grande jogo. Um jogo em que a curiosidade, a coragem e a criatividade são tão importantes quanto o próprio resultado. Porque, no final, o verdadeiro valor não está em quem chega primeiro, mas na jornada que percorremos, nas lições que aprendemos, e na alegria de jogar, simplesmente por jogar.

Divertida Mente 2


 Ilhas da Personalidade e a Jornada de Riley


DANDARA MOREIRA


"Divertida Mente 2" nos leva de volta à mente de Riley, agora uma adolescente, enfrentando as complexidades de crescer. Suas ilhas de personalidade — representações emocionais de suas paixões e valores — continuam a ser o alicerce de quem ela é. As memórias, essas esferas coloridas que armazenam suas experiências, estão intrinsecamente ligadas às ilhas, moldando e remodelando seu caráter à medida que novas situações surgem.


Ela agora enfrenta desafios que exigem que suas ilhas se adaptem e evoluam. A Ilha do Hockey, que no primeiro filme era um símbolo claro de sua paixão, se transforma à medida que novos interesses surgem, representando como as experiências e os ambientes moldam não só a personalidade, mas também a resiliência. O cheerleading, por exemplo, poderia perfeitamente ocupar seu lugar como uma nova ilha, carregada de energia, trabalho em equipe e identidade.


E se Riley fosse uma jovem negra? Como isso impactaria suas memórias, sua formação e suas ilhas da personalidade? A vida de uma adolescente negra traria à tona uma Ilha da Resistência, onde cada desafio enfrentado devido à sua cor de pele adicionaria camadas de força e introspecção à sua personalidade. A falta de neutralidade corporal e a constante luta por aceitação em espaços que não foram feitos para acolher sua identidade racial criariam uma Riley mais consciente de si mesma e do mundo ao seu redor, mas também mais solitária em sua jornada.


Além disso, se Riley questionasse seu gênero ou enfrentasse desafios de classe social, suas ilhas seriam moldadas de maneira completamente diferente. O enfrentamento de preconceitos, as pressões sociais e a falta de representatividade não só formariam ilhas de resistência e luta, mas também forçariam Riley a uma introspecção que uma vida mais neutra talvez não exigisse.


O filme, por sua vez, mostra como as ilhas da personalidade são essenciais para nossa saúde mental, revelando a fragilidade e a força que todos carregamos. Embora "Divertida Mente 2" não explore as interseccionalidades de raça, gênero e classe, ele ainda oferece uma visão sensível sobre o crescimento e a saúde mental na adolescência, destacando a importância de acolher nossas emoções, independentemente de nossas circunstâncias.



Se Riley Fosse Dandara, e Vice-Versa


Se Riley fosse Dandara, e vice-versa, as ilhas da personalidade teriam cores e formas diferentes. A Ilha do Cheerleading, tão cheia de energia e camaradagem, seria uma fortaleza de autoconfiança e disciplina para ambas. Para Dandara, o cheerleading é mais do que um esporte; é uma declaração de identidade, onde a performance física e a presença de espírito se encontram em um espaço de expressão e afirmação pessoal.


A música do chiclete repetitivo, que poderia simbolizar uma trilha sonora constante da vida, seria a batida que embala as memórias de infância, seja das Spice Girls ou do rap visceral de Racionais MCs. Cada música que marca uma fase da vida se tornaria uma ilha, uma memória que pulsa e vibra, conectando-se a outros momentos e emoções.


Minha Ilha da Criação seria um lugar de palavras e ritmos, onde as autoras Bell Hooks e Cassandra Clare conversam com as batidas do rap e as melodias de Andrea Bocelli. Seria um espaço onde o toque artístico, que muitas vezes tentei esconder, se manifesta em histórias contadas e recontadas, uma ilha queer, artística e vibrante, cheia de cores e sons que desafiam a norma.


Crescendo como Dandara, a ilha da auto aceitação teria sido construída lentamente, pedra por pedra, em um mar onde as ondas do preconceito e da falta de representatividade batiam constantemente. Mas, assim como Riley encontrou seu caminho através das emoções conflitantes, eu também encontrei nas palavras, nas músicas e nas histórias a força para construir minhas ilhas, e continuar navegando nesse mar vasto e complexo que é a vida. 


No fim, seja na mente de Riley ou na minha, as ilhas da personalidade são as âncoras que nos mantêm firmes em nossa jornada, lembrando-nos de que somos uma soma de todas as nossas experiências, e que cada ilha, cada memória, é essencial para formar quem somos.

segunda-feira, 26 de agosto de 2024

Cordel da Razão e Criatividade

LORENA VERISSIMO


No livro de Marcos Nicolau, a gente encontra, 

Que razão e criatividade, juntos, se encantam.

A neurociência revela a mente em ação,

Desvendando o mistério da nossa percepção.


A razão nem sempre manda no coração,

Às vezes o inconsciente faz a decisão.

Na pedagogia, é preciso compreender,

Que a criatividade é vital pra aprender.


Na sala de aula, saber é o que não falta,

Mas é a combinação que a mente exalta.

Equilibrar razão e imaginação,

É a chave para uma educação de transformação.

Os jogos na sociedade

MARCELO MARQUES


Pouco se fala como os jogos auxiliam no desenvolvimento da sociedade.

Ao longo dos anos, estudiosos e entusiastas da ciência incentivaram o estudo sobre a necessidade de se utilizar jogos para entender a mente humana e seus comportamentos.

Os jogos, de certa forma, causam um ambiente de profundo pensamento, em casos específicos estimulam o vício desenfreado, exacerbando a necessidade individual de cada um em se colocar diante das fraquezas e tropeços. O que leva ao pensamento de que o verbo “jogar”, transcende o dicionário e se torna algo concreto e diário na vida de muitos na sociedade.

Em uma noite tranquila de uma segunda, por exemplo, o jogador pode ter a sorte de ganhar todos os jogos e receber uma fortuna. Contudo, na terça pela manhã, no caos da sua vida, pode perder tudo no mesmo jogo o qual teria vencido na noite anterior.

Ao relacionar, o termo “ludosofia”, com a necessidade do indivíduo de expressar os seus sentimentos, as crianças entram no estudo como aspecto importante na necessidade de compreender o desenvolvimento da mente humana.

Em muitas clínicas psiquiátricas e terapêuticas pediátricas, hoje em dia, pode-se notar a presença de brinquedos, canetas e papéis não aleatórios, tudo é feito para que a criança expresse o seu sentimento em forma de brincadeira, colocando para fora através da arte, o que não conseguiria através das palavras.

A partir daí, o desenvolvimento da indústria dos jogos e terapêuticas, se correlacionam no desenvolvimento de materiais que estimulem a mente humana e propaguem o conceito de se entender como a mente humana cresce e reproduz os pensamentos da sociedade em sua própria perspectiva.

domingo, 25 de agosto de 2024

com ou sem emoção

 Do que vale a vida sem diversão?



Valcidney Soares


“Mas do que vale o ensino sem criatividade?”, se perguntava Luna que, tal como o astro que deu origem ao seu nome, brilhava ao ver que a educação poderia ser mais do que sentar, ouvir, obedecer. Luna era inquieta. Aos 14 anos, nascida em um mundo onde “analógico” era quase palavra morta, sentia sede de se fazer ser compreendida, ainda que, na ânsia de aprender, não entendia o porquê do digital do seu dia a dia não se aplicar ao que vivia.

Tudo mudou com Yara, professora de Filosofia recém-chegada, que inquieta com aquela escola quase militarizada (“sente”, “ouça”, “obedeça”), propôs uma nova metodologia: a do aprender com diversão.

Ela chegou com um tal de Kahoot, que fez mudar a forma de lidar com o celular dentro de sala de aula. Proibição? Nunca mais. Prudência? Sempre.

Da Grécia Antiga à Filosofia Contemporânea, Luna passou fases, ganhou pontos, viu um objetivo mais factível. Perdeu, ganhou, soube administrar. Ajudou amigos e se fez ser ajudada. O Kahoot deixou de ser a única ferramenta. Participou de missões, enfrentou desafios, resolveu enigmas e completou tarefas em equipe. 

Aquela coletividade para completar as fases, resultado da união da tecnologia com a educação, fez a menina-lua, antes fechada, se abrir mais. Os badges e troféus que perdeu, antes de a fazer se sentir desmotivada, geraram o efeito contrário: a vontade de, nos tempos dedicados ao estudo em casa e no período livre, perceber que a Filosofia, como na música de mesmo nome de Noel Rosa, a auxiliavam a viver indiferente. E Luna se fez brilhar ainda mais.

sexta-feira, 23 de agosto de 2024

a descoberta


Carlos Vitor Soares Freire


Em uma tarde chuvosa, Ana, uma estudante de artes visuais, estava sentada em sua mesa, cercada por lápis, pincéis e folhas em branco. Ela havia recebido uma tarefa desafiadora: criar um projeto que unisse a pesquisa acadêmica com a criatividade artística. Sentindo-se um pouco perdida, decidiu buscar inspiração na biblioteca da universidade. Ao caminhar pelos corredores repletos de livros, um título chamou sua atenção: *"Imagem, pesquisa e criatividade: os quadrinhos como vetores do conhecimento"*. Curiosa, ela puxou o livro da estante e começou a folheá-lo. As palavras saltaram das páginas, revelando um universo em que os quadrinhos não eram apenas entretenimento, mas uma poderosa ferramenta de comunicação e aprendizado.

Imersa na leitura, Ana descobriu como os quadrinhos poderiam expressar ideias complexas de forma acessível, mesclando imagem e texto em uma narrativa visual que transcende a mera ilustração. A obra falava sobre como os quadrinhos têm o poder de sintetizar informações e, ao mesmo tempo, estimular a imaginação, transformando a experiência de aprendizado em algo dinâmico e envolvente.

Inspirada pelo que leu, Ana decidiu aplicar essa abordagem em seu projeto. Ela começou a desenhar um quadrinho que explorava a história da arte através dos séculos, mostrando a evolução dos estilos e técnicas de maneira lúdica e informativa. Cada página do quadrinho era fruto de uma pesquisa detalhada, mas o que fazia a diferença era a forma criativa como ela organizava e apresentava o conhecimento.

Quando finalmente apresentou seu projeto, Ana percebeu o impacto que o uso dos quadrinhos teve. Seus colegas e professores ficaram fascinados pela maneira como ela conseguiu transformar conceitos acadêmicos em uma narrativa visual cativante. O livro que encontrou na biblioteca não apenas a ajudou a concluir sua tarefa, mas também abriu seus olhos para o vasto potencial que a arte sequencial pode ter como ferramenta educacional. Assim, Ana passou a ver os quadrinhos sob uma nova perspectiva, não apenas como uma forma de expressão artística, mas como um meio eficaz de transmitir conhecimento, capaz de engajar, ensinar e inspirar.

terça-feira, 20 de agosto de 2024

Criatividade e Inteligência

Marcos Nicolau escreveu para pensarmos 

Sobre a razão e a criatividade

Um processo de importância para nós

Se queremos conquistar liberdade

Construir um futuro e ser autodidata

Passa pelo caminho da proatividade


Astrócitos, glias e neurônios 

Participantes das sinapses nervosas

Essa interação que constroem nossos pensamentos

Capacitando nossas prosas

Um meio criativo para solucionar e criar

Entender esse conceito é uma atividade preciosa


A inteligência é criadora

E nos faz sonhar e inventar

Um mistério resolvido em obra

Sempre a nos maravilhar

Como a teoria do caos e criatividade

Que nos fazem inspirar


Para um poeta ou advogado

Na arte e na ciência

É necessário aprender e ler

Para criar com sua inteligência

Não basta ter um alto QI

Se não deixar de lado a prepotência

terça-feira, 13 de agosto de 2024

Aprendendo a jogar

Pedro Dias

No reino da palavra, um game se desenha, 

Letras e números se tornam a senha. 

Alfabetizar é mais do que ensinar, 

É fazer da jornada um mundo a desbravar.


A cada letra, um desafio se abre,

Por um jogo onde o saber nunca se acabe.

Palavras são peças de um quebra-cabeça,

Que se encaixam na mente com muita destreza.


Pontuação é um prêmio, uma conquista.

E a leitura, uma rota que nos dá a pista.

Jogos de rimas, aventuras de prosa,

Transformam a aprendizagem em festa maravilhosa.


Desafios são como mapas encantados,

Que guiam os passos de pequenos exploradores.

Cada acerto, uma estrela que brilha,

Cada erro, um passo que ensina e faz trilha.


[Vivendo e aprendendo a jogar

Nem sempre ganhando,

Nem sempre perdendo,

Mas aprendendo a jogar]


Entre tabuleiros e telas interativas,

O alfabeto se revela como música harmônica.

A matemática dança, a ciência se expande,

E o saber, então, se desdobra e responde.


Com pontuações e badges no caminho,

A alfabetização se torna um belo destino.

Não é apenas ensinar, é fazer crescer,

Transformar o aprender em puro prazer.


Assim, a gamificação tece o enredo

De um aprendizado que ganha um roteiro.

Na diversão, a criança encontra a luz,

E no jogo, a alfabetização se traduz

O livro encantado

 


RAFAEL DA SILVA

Lys era uma garota esperta e curiosa. Em uma tarde fria e chuvosa, encontrou um livro antigo, escondido na escrivaninha, na biblioteca de sua avó. A capa era de uma seda roxa, com detalhes dourados, e não havia título. Muito bisbilhoteira, não se conteve, Lys abriu o livro, e as páginas começaram a brilhar suavemente, encantando a garota.

Ela começou a ler, e de repente sentiu uma tontura. As palavras nas páginas começaram a se mover, girando diante de seus olhos. Um vento forte soprou pela janela, e Lys foi sugada para dentro do livro. Quando abriu os olhos, não estava mais na biblioteca, mas em uma floresta exuberante.

Tudo ao seu redor parecia mágico. As árvores eram enormes, as folhas brilhavam como turmalinas paraíba, se estendendo até o céu. Lys percebeu que estava em um mundo completamente novo. Ela começou a desbravar aquele local, e enquanto caminhava, encontrou criaturas misteriosas, eram fadas, duendes e animais que nunca tinha visto. 

Uma das fadas, voou até Lys e explicou o que estava acontecendo, aquele mundo estava sendo tomado pela escuridão. Um turbilhão de sensações tomou conta de Lys, assustada, entusiasmada e fascinada, ela decidiu que faria o que fosse necessário para ajudar, o mundo mágico.

Lys e os seres mágicos confrontaram a origem da escuridão, era uma criatura que se alimentava da solidão e tristeza. A união, a força, a coragem e a compaixão de Lys e dos seres mágicos, foram suficientes para derrotar a terrível criatura, e a paz naquele mundo voltou a reinar.

Quando a última página do livro foi virada, Lys voltou à biblioteca de sua avó, segurando o livro em suas mãos. Tudo parecia um sonho, mas o brilho em seus olhos e o amor no seu coração, mostrava que tudo havia sido real. Ela sabia, que sempre que quisesse, bastaria abrir o livro, para uma nova aventura viver.


quarta-feira, 7 de agosto de 2024

Inspiração

Guilherme de oliveira


Criatividade é luz que brilha, 

Dentro da mente, um tesouro a explorar, 

Em cada criança, uma faísca que cintila, 

Esperando o momento de se revelar.


Na educação, é preciso encantar, 

Com curiosidade e novas ideias a plantar, 

Nicolau nos ensina, em seu livro a inspirar, 

Que a mente criativa pode muito alcançar.


"Introdução à Criatividade", uma obra a guiar, 

Mostra caminhos para inovar e crescer, 

Na escola e na vida, a chama a despertar, 

Com cada pensamento, aprender e florescer.


Educar é mais que ensinar a ler, 

É abrir portas para o imaginar, 

Com criatividade, vamos ver 

Um futuro brilhante a nos esperar.

terça-feira, 6 de agosto de 2024

robô criativo


Amanda Menezes Sá Figueredo

O ano é 2180. Robôs humanoides são integrados à sociedade e fazem parte da manutenção essencial de todos os seus aspectos. O papel deles é simples: foram programados para executar tarefas diárias, sem questionar. O objetivo principal é facilitar a vida da humanidade.

Embora todos os dias fossem iguais, às vezes coisas inusitadas e diferentes aconteciam. Em um desses dias, um robô, sem nome e designado para auxiliar as crianças de uma creche, organizava os brinquedos e o material escolar do que as professoras chamavam de “Hora da Brincadeira". Na mesma sala, havia uma menina. Afastada das demais crianças, ela criava uma história sobre dragões e princesas utilizando blocos coloridos de construção e bonecas.

Intrigado pela paixão da menina ao narrar o que parecia uma história épica entre fogo e um caçador, o robô a observou por um tempo. Instintivamente, ele começou a reorganizar os blocos com movimentos precisos e cuidadosos, tentando seguir a narrativa que a criança criava. Aos poucos, os blocos foram transformados em um elaborado castelo com torres e passagens secretas. Era uma visão impressionante e grandiosa, algo que, para um humano, levaria dias para terminar.

Quando a menina viu a construção, seus olhos brilharam e ela sorriu:

— Você também pode ser criativo! — ela disse, encantada, admirando o trabalho do robô.

Pela primeira vez, o robô percebeu que, além de seguir comandos, poderia usar sua programação para interpretar e criar. Era uma nova forma de ajudar, e ele se sentiu preenchido com uma sensação inédita: a alegria de criar junto com alguém. Assim, o robô aprendeu que a criatividade não era exclusiva dos humanos e que até mesmo uma máquina poderia contribuir para o mundo de maneiras inesperadas.

terça-feira, 16 de abril de 2024

Curso de técnicas de criatividade


Curso online completo, com
Murilo Gun, liberado gratuitamente pela Keep Learning School

Primeira aula:




a vida é um jogo?

 Uma pergunta simples: a vida é um jogo? A vida é algo que disputamos, em que há vencedores e perdedores? Acredito que não. Mesmo se pensarmos em competição de genes e em 'seleção natural', o critério evolucionista de Darwin da sobrevivência do 'mais forte' já foi substituído pelo critério da capacidade de adaptação e resiliência (Lamarck). A vida seleciona os mais flexíveis e resistentes.

Mas, também compreendo que a vida vem se tornando uma competição. A vida moderna é uma aventura. Somos todos heróis a procura do grande amor e da realização no mundo. Por isso, tornamos nossas vidas narrativas de risco. Risco de vida, risco de não sermos amados, de não sermos bem sucedidos. Risco do fracasso dos perdedores. A vida está se tornando um jogo. Nesse contexto, estamos vivendo um processo de 'gamificação' das relações sociais e das interações: a aplicação das estratégias e do design competitivo dos jogos em outras práticas sociais, com o objetivo de aumentar o engajamento dos participantes.

A gamificação das relações sociais se dá a nível estrutural, como disputas entre instituições sociais; como se a sociedade se tornasse um imenso mercado. Já a gamificação das interações se dá no micro espaço do cotidiano, acirrando a competição entre as pessoas em torno diferentes objetos de disputa, como “se a vida fosse um jogo”.

Atualmente, o aprendizado está se 'gamificando', tornando-se lúdico e competitivo. As antigas disciplinas estão se tornando 'narrativas seriadas ', em que cada aula é um episódio (representando um conteúdo específico) e um capítulo de um arco narrativo maior (correspondendo a um estágio de um conjunto de conteúdos cumulativos). As avaliações são desafios para que o aluno assimile o conteúdo específico e avance em relação ao conjunto de conhecimentos sequenciais.

A gamificação representa a inserção do risco controlado – a incerteza lúdica - no aprendizado e na própria vida. Para tanto, não é preciso muita tecnologia. Basta viver feliz e consciente das próprias limitações, mas sempre buscando por desafios para transcendê-las.

O conceito teve grande repercussão na área de comunicação: o livro Gamificação em Debate (SANTAELLA, 2018) traz um coletânea importante de autores de diferentes áreas, demonstrando que a atividade lúdica aplicada a outras atividades não promove apenas engajamento motivacional, mas, sobretudo, em mudanças profundas de comportamento. Para esses autores, a gamificação retoma os aspectos lúdico e criativo que todos têm incubado, ampliando a qualidade cognitiva do aprendizado e do desempenho.

Por outro lado, existem também os contrários à gamificação, que vêem o processo de modo colonizador e exclusor da maioria, uma vez que apenas as elites têm acesso aos jogos eletrônicos, à robótica e a um ensino mais individualizado. A gamificação, assim, aumentaria muito mais a desigualdade social e a exclusão cultural. Os jogos nos tornam mais competitivos e menos solidários, reforçando assim, do ponto de vista pessoal, os imperativos da sociedade global capitalista.

Há também o trabalho do professor Marcos Nicolau (2018a, 2018b, 2018c, 2018d, 2019, 2021) da UFPB sobre ludosofia - conceito que desloca o foco da gamificação de um artificio de engajamento motivacional para o aprendizado existencial dos jogos em si.

Por que jogar?

Jogar ensina a viver, a perder, a ganhar, a lidar com as emoções, a ser ético - independentemente do conteúdo que está sendo ensinado de forma colateral. Os jogos, além da memorização e visualização do conhecimento em diferentes áreas (história, geografia, biologia, matemática, etc), também desenvolvem o amadurecimento emocional, a aceitação das perdas, a empatia com os outros.

Agora nossa questão aqui é - levando em conta os prós, os contras e os dialéticos - pensar da perspectiva pedagógica, como formar protagonistas, desenvolvendo competências e habilidades sócio emocionais através de jogos?

E, do ponto de vista social: os jogos podem, ao contrário do que se pensa, contribuir para construção de sua sociedade mais solidária e menos competitiva? A democracia é um jogo?

E ainda, em uma perspectiva pessoal: Como transformar a própria vida em uma aventura criativa? Como inserir a 'incerteza lúdica' em nossas vidas de modo decolonial e criativo?


NICOLAU, Marcos. Dezcaminhos para a criatividade. 2. ed. João Pessoa: Ideia, 2018a.

https://drive.google.com/file/d/132ZVUcLz5vXNZXe9yoB7Do-rpUVChbU5/view


____ Introdução à criatividade. 2. ed. João Pessoa: Ideia, 2018b.

https://drive.google.com/file/d/15bErzpm3ZEgPJ9rag3gSqZyjVGXaufHe/view


____ Ludosofia: a sabedoria dos jogos, 2ª ed. João Pessoa: Marca de Fantasia, 2018bc.

https://drive.google.com/file/d/1zjiOORuX2xYXeZydvOREKqRO1YicJWUJ/view


____ Razão e criatividade: tópicos para uma pedagogia neurocientífica. 3. ed. João Pessoa: Ideia, 2018d.

https://drive.google.com/file/d/1Eg2UCSTMMipyp54ooOCxhQ1U4FCHZKOA/view


____ Games e gamificação: práticas educacionais e perspectivas teóricas. João Pessoa: Ideia, 2019.

https://drive.google.com/file/d/1Zenw8rDY-aSfeymKaj61FjJR44_dpDBG/view


____ Ludoaprendizagem desplugada: pensamento computacional com jogos de tabuleiro no ensino fundamental. João Pessoa: Ideia, 2021.

https://drive.google.com/file/d/12YJMuK17waFVHJ7t16qUW8jxiTeAd-N4/view?usp=sharing



Técnica Gunddens


 

um modo de ser

 


O lúdico como discurso e 'modo de ser'

O professor André Lemos, a partir de sua teoria Ator-Rede com Latour, descreve o lúdico como um modo de existência moderno.

"A modernidade caracteriza-se por uma forma específica de enquadramento da atividade lúdica, seja para infantilizá-la, seja para ajustá-la como um negócio (do entretenimento). Acredito que a dimensão lúdica seja uma das chaves para empreender uma antropologia dos modernos, já que o que chamarei aqui de “seres do jogo” nos constituem, nos provocam, “jogam” com a nossa subjetividade e com o nosso corpo por intermédio de artefatos (“brinquedos fetiches”), narrativas e regras específicas."

Lemos apresenta os modos de existência, propõe mais um modo (lúdico), apontando para a existência de “seres do jogo”, e estabelece correlações deste com outros modos, como o da técnica, o da metamorfose e o da ficção. Essa forma ontológico de pensar tem suas vantagens e suas desvantagens. Mas, se pensando de forma mais epistemológica e arqueológica, visualiza-se melhor que o lúdico é anterior aos outros modos de ser e que passou por transformações históricas em virtude de sua relação com a tecnologia e com a narrativa.

Isso em dois sentidos distintos e complementares. O lúdico é anterior ao Outro – para Orlandi (análise discursiva) e para Winnicott (psicologia infantil); e o lúdico como contexto histórico é anterior à escrita e à história – como defende Flusser entre outros.

Orlandi (1980) sugere um modelo tipológico dos discursos segundo a participação dos interlocutores na produção do Sentido.

·          Discurso autoritário - O emissor impõe as suas necessidades de transmissão à realidade-referente da linguagem. O discurso tende à ‘paráfrase’, ou seja, à repetição da identidade do sentido e da ordem subjacente à sua transmissão. O resto é ‘ruído’.

·          Discurso lúdico - O receptor (ou a percepção) se apropria da realidade-referente, submetendo a transmissão a fatores aleatórios e/ou às necessidades de desenvolvimento da linguagem. O discurso aqui tende à polissemia e à multiplicidade do sentido. 

·          Discurso Polêmico - O sentido é construído pela reversibilidade dialógica entre os polos interlocutores da linguagem. O discurso, neste caso, é uma ‘tensão’ entre a paráfrase e a polissemia, entre a identidade e a multiplicidade do sentido.

Toda imposição de realidade referencial e toda linguagem instituída pelo emissor é discurso autoritário, em oposição à semiose absoluta do receptor, os sonhos e o simbólico, o discurso lúdico. Isso aponta para uma discrepância estrutural entre o método científico e o objeto lúdico, uma inadequação entre brincar e estudar.

No brincar, o lúdico é anterior ao outro. Benjamin, Winnicott e outros falam da relação entre eu e brinquedo como uma preparação para o outro. Muitos pensadores de ensino tradicional consideram que o começo do aprendizado começa o letramento e as quatro operações, que a socialização da escola estabelece o final da zona de conforto infantil. O aprendizado torna-se sério e sem graça porque exige concentração contínua e disciplina corporal. Jogar é uma prática mista entre brincar e aprender. E 'jogar a dois' (ou mais) é simular uma situação hipotética através de disputa simbólica. A socialização e a criatividade são estimuladas ao máximo pela dinâmica cooperação/competição. O que nos leva a pensar que o verdadeiro objetivo de jogar é desenvolver a criatividade.

Na perspectiva de Flusser, a pós-história ou pós-escrita está, através dos meios de comunicação, resgatando a ludicidade dos jogos anteriores à escrita e produziando a 'gamificação das relações sociais e das interações'. A gamificação acontece dentro das instituições quando o modelo do jogos passa a organizar outras práticas sociais. Flusser condena a gamificação, o divertimento e o entreterimento como formas de domesticação do lúdico.

No entanto, a gamificação do aprendizado faz parte de transformarmos nossas vidas em aventuras de risco. O aprendizado das relações dentre o eu e o outro está se configurando como uma Jornada existencial. Para alguns a jornada do herói; para outros, da heroína.  'Aprendizado' é a prática e produto de aquisição e assimilação de ganhos simbólicos nas relações entre Eu e Outro. Por 'simbólico' entendo não apenas o conhecimento mas também a sabedoria; não apenas a informação mas também a incorporação de habilidades e o desenvolvimento de competências. 'Simbólico' também representa visibilidade, status, prestígio. O que, de modo secundário, também se aplica a ideia de aprender, como resultado de nossas interações. O aprendizado simbólico é a aquisição de repertório e da prática de performance. O jogo ensina a saber perder e a saber ganhar, a saber se colocar no lugar do outro, seja do ponto de vista interpessoal ou do intercultural, o jogo ensina a capacidade de adaptação e de diálogo.

Técnica Zoom Out


 

O lúdico como simbólico

 


Dietmar Kamper (1998) estudando o jogo como metáfora da vida, chama a atenção sobre a discrepância estrutural entre "o método e o objeto" desta pesquisa, sobre a inadequação entre a atividade lúdica e o rigor científico dos discursos que pretendem estudá-la.

Norval Baitello Jr (1997, 58), a partir das ideias de Walter Benjamin (1985), afirma que essa dificuldade metodológica apenas espelha a dicotomia cultural e cognitiva entre o mundo adulto (e a lógica das "coisas necessárias") e o universo infantil (e do "aparentemente supérfluo").

Winnicott (1975) é o grande estudioso do Brincar e deste universo como um espaço alternativo à realidade imposta pela cultura. A alfabetização e o aprendizado das quatro operações matemáticas básicas exige concentração e disciplina. Com elas, surge o mundo sério dos adultos, em que os atos têm consequências e o lúdico é visto como uma irresponsabilidade.

Edgar Morin (1979:116-117) crê que a construção histórica do Homo Sapiens (homem do saber racional) teve como efeito colateral o (sub)desenvolvimento do Homo Demiens (homem-louco). O primeiro corresponde ao universo adulto e o último, ao mundo da desordem e irracionalidade reprimida no inconsciente em seus diferentes aspectos.

Vilém Flusser (1998) elabora a noção de 'homo ludens', como a superação dessa dicotomia entre razão e loucura e, acrescentamos, como um retorno ao nossa criança interior. Além disso, Flusser caracteriza o 'modo de ser brasileiro' como um protótipo global do homo ludens, que não se identifica nem com a vitória dos colonizadores nem a derrota dos colonizados, mas tem como estratégia de longo prazo a resistência criativa à aculturação colonizadora.

Porém foi Ivan Bystrina (1995) quem melhor definiu o papel cognitivo da atividade lúdica em relação ao pensamento lógico. Para ele, há três níveis inter-relacionados de codificação de mensagens.

·         O código primário, formado através de sinais simples e se organizam a partir da experiência e de regras predeterminadas dos sistemas vivos em sua evolução. Chamamos esse código de BRINCAR.

·         O Código secundário, uma consciência coletiva através de signos construídos a partir de uma estrutura comum, um sistema institucional de cognição coletiva – para o qual é necessário ESTUDAR.

·         E o Código terciário representa um nível de codificação cultural, para além das instituições sociais, e que constitui em uma “segunda realidade” para perpetuar mensagens para futuras gerações.

Esta “segunda realidade” formada por nossos sonhos e desejos profundos está presente no JOGAR e resulta da perda de nexo reconhecível com as necessidades imediatas de sobrevivência. A segunda realidade é o "não-sério" e os jogos são uma das portas deste universo simbólico (ao lado do sonho, das doenças mentais e do extase místico induzido). A classificação de Bystrina equivale a dizer que o Brincar corresponde ao corpo e a mídia primária; o Estudar, à linguagem estruturada e a mídia secundária; e o Jogar, à simulação de risco no futuro e aos meios de comunicação. A segunda realidade tem o objetivo de antecipar e simular situações possíveis de se configurar. É a simulação dos futuros possíveis que fornecem probabilidades para o presente se organizar.

A teorização sobre jogos começou com os gregos, levando em conta a forma como o inesperado ou o acaso se manifestam. Nesse sentido, existem quatro tipos ideais de jogos: Agon, Alea, Mimicry, Ilynx.

·         Agon, os Jogos de Azar (a roleta, por exemplo). O ruído aqui é Objetivo e equivale ao acaso. Calcula-se a probabilidade (1/6 de chances em jogo de dados, por exemplo) e compara-se com os resultados empíricos. Obtém-se, então, um quadro analógico entre um modelo ideal (as "condições iniciais") e os resultados.

·         Alea, os Jogos de Adivinhação (como o jogo de búzios). O ruído é Subjetivo e dificulta a comunicação com o futuro. Aqui não existe um "resultado errado" ou discrepante do modelo, todo ruído é, por definição, ignorância de quem não entende.

·         Mimicry, os Jogos de Performance são aqueles em que o desempenho individual é determinante. O ruído aqui é, em parte ambiental, em parte cognitivo. O golfe, o surf e o "jogo de paciência" são alguns dos jogos que combinam acaso e autoconhecimento. Para estudar tais jogos é preciso tanto considerar as variações e discrepâncias probabilísticas de cada jogo (compreendido como um conjunto de regras e possibilidades lógicas) como também os diferentes níveis de intencionalidade e consciência dos jogadores.

·         E, finalmente, Ilynx, os Jogos Competitivos, que tanto podem ser de estratégia pura (como o xadrez, por exemplo); como baseados na força, na velocidade ou em outras qualidades físicas e psicológicas. Estes jogos é que geralmente são estudados na chamada Teoria de Jogos de Soma Zero. O ruído aqui é Intersubjetivo e consiste em uma forma enganar o adversário ou de ser enganado por ele.

Na prática a maioria dos jogos é uma combinação dessas modalidades ideais. Um jogo de pôquer ou de futebol implica tanto em sorte (ou escapar ao ruído objetivo), assertividade (ou não se confundir com o próprio ruído subjetivo) e blefe (ou enganar e não ser enganado pelo ruído intersubjetivo). Nesta classificação, o interessante é a diferença de tipos de ruído. Nos primeiros jogos (de Azar, de Adivinhação e de Performance) o ruído resulta de nossa própria ignorância e corresponde à relação entre o homem e a natureza; enquanto os jogos competitivos (ou de soma zero) o ruído é utilizado para enganar o adversário e corresponde a relação dos homens entre si (WIENER, 1954).

Técnica Brainwriting


 

Teoria matemática dos jogos

 

Os jogos não cooperativos com soma zero se referem especificamente aos conflitos, enquanto os outros tipos de jogos correspondem à atividade lúdica em si. Os jogos competitivos são o principal objeto de estudo da teoria matemática dos jogos. Como vimos, ela é a análise lógica de qualquer situação na qual apareça um conflito de interesses, com a intenção de encontrar as opções ótimas para que, nas circunstâncias determinadas, consiga-se o resultado desejado.

A teoria tem três gerações diferentes: Von Neumann & Morgenstern, os criadores da Teoria dos Jogos; Anderson & Moore, responsáveis pela passagem da teoria clássica para a moderna caracterizada pela ideia de 'informação incompleta'; e Robert Aumann, responsável pela noção de racionalidade bayesiana, que amplia a incerteza no cálculo das escolhas.

Os matemáticos John von Neumann e Oskar Morgenstern (1944) lançaram as bases da teoria em Theory of Games and Economic Behavior, que interpretava as escolhas racionais e os acontecimentos sociais por meio dos modelos de jogos de estratégia, ou seja, diante de uma certa gama de opções, os agentes escolheriam aquelas estratégias de ação que lhes fossem mais vantajosas de acordo com um cálculo acerca de sua probabilidade e satisfação máxima de sua utilidade.

Uma estratégia é a lista de opções ótimas para cada jogador, em qualquer momento do jogo. Para poder deduzir as estratégias ótimas sob diferentes hipóteses quanto ao comportamento do resto dos agentes, é necessário analisar vários aspectos: as consequências das diversas estratégias possíveis, as possíveis alianças entre jogadores, o grau de compromisso dos contratos entre eles e o grau em que cada jogo pode se repetir, proporcionando a todos os jogadores, a informação sobre as diferentes estratégias possíveis.

Von Neumann & Morgenstern tinham o projeto de "construir uma teoria inequívoca da racionalidade para situações cujo modelo é um jogo, onde toda ação está condicionada em alguma medida pela expectativa das reações que ela pode engendrar". Calcada sobre alicerces matemáticos, a Teoria dos Jogos propôs uma nova maneira de formalizar os princípios da ciência política, a partir do comportamento e preferências subjetivas.

Com Anderson & Moore (1962), surgem as probabilidades subjetivas e a matematização dos conflitos se torna mais psicológica. Eles comparam a matemática dos jogos à abordagem comportamental através da analogia entre o jogo e o enigma (puzzle). O puzzle caracteriza uma situação de incerteza externa, em que há algo que se ignora e cujo conhecimento implica na solução do problema; enquanto no jogo há uma situação de incerteza interna, nas quais as próprias tentativas de se alcançar uma solução afeta os termos do problema que se quer solucionar. A ignorância dos jogadores passa a ser estimada como ruído. Troca-se o modelo de dois jogadores completamente informados em uma racionalidade coletiva perfeita por um modelo múltiplo em que a intenção e as expectativas (individuais, corporativas e/ou públicas) em relação aos outros passam a ser decisivas. 

Com Robert Aumann (1987), a teoria matemática dos jogos dará um novo passo, combinando probabilidades lógica e subjetiva dos jogadores em seu modelo e adotando definitivamente as ideias de 'mundo aberto' e 'observador externo'. Aumann amplia o papel da incerteza porque não distingue jogo e puzzle, não faz distinção entre o ruído externo e o intersubjetivo. Neste modelo, o observador é sempre um meta-jogador.

Com isto, o Jogo, então, passa a ser uma questão de (auto) Conhecimento. Aumann observa que, levando em conta um determinado número de ações interdependentes, não há um único resultado final, mas sim um número indeterminado de soluções possíveis, de equilíbrios relativos para o sistema. O número de possíveis “soluções” se multiplica bastante se admitirmos que as pessoas reais geralmente busquem táticas suficientes para a realização de suas metas imediatas e não estratégias ótimas. A metateoria de Aumann integra uma racionalidade econômica como tática de todos à racionalidade estratégica de alguns. Para lidar com esta complexidade de resultados possíveis, introduz-se a noção de 'informação imperfeita' por meio da distinção entre incerteza e risco: enfrentando o risco, os jogadores são capazes de atribuir probabilidades aos vários resultados, ao passo que, confrontadas com situações de incerteza, não são capazes de fazê-lo. Surge assim o cálculo da utilidade esperada ou do valor estimado de cada ação quando enfrentam o risco. Atualmente versão de Aumann da teoria de jogos envolvendo cooperação entre concorrentes e negociação de conflitos) tem aplicações na área de ciência política e relações internacionais, ganhando prêmios de Nobel de economia em 1994 e 2005.

Com base nesse resumo da teoria dos jogos, pode-se ver que sua vantagem é a forma como integra as relações entre micro/macro, ação/estrutura e indivíduo/instituição em um único modelo. A teoria dos jogos é uma teoria viva, que afeta o mundo que estuda. No entanto, a grande desvantagem da matematização é a descontextualização histórica e cultural dos jogadores.

De forma que a teoria dos jogos vale mais como uma ferramenta heurística do que como uma teoria para solução de conflitos. Essas limitações podem ser minimizadas pela sua inclusão em teorias mais abrangentes e complexas, observando a contextualização dos jogadores em situações históricas e culturais concretas e considerando também os valores culturais e as normas sociais no comportamento pessoal.

Técnica Da Vinci


 

Técnica Advogado do Anjo


 

jogos, política e mídia

 


Pierre Bourdieu também comparou (metaforicamente) sua teoria dos campos aos jogos, em que os agentes disputam por prêmios dentro de um regime de regras pactuadas, que eles fazem apostas. E da mesma forma que cada jogo tem suas regras de funcionamento, cada campo social (política, arte, economia) também teria um conjunto específico de regras. Porém, Bourdieu também criticou (em seus estudos sobre o capitalismo mercantil em sociedades coloniais como a Argélia) as teorias tradicionais dos jogos por acreditarem que todos os agentes são motivados universalmente pelo cálculo de custo/benefício. 

Efetivamente, podemos comparar o campo a um jogo (embora, ao contrário de um jogo, ele não seja o produto de uma criação deliberada e obedeça a regras, ou melhor, a regularidades que não são explicitadas e codificadas). Temos assim móveis de disputa que são, no essencial, produtos da competição entre jogadores; um investimento no jogo, illusio (de ludus, jogo): os jogadores se deixam levar pelo jogo, eles se opõem apenas, às vezes ferozmente, porque têm em comum dedicar ao jogo, e ao que está em jogo, uma crença (doxa), um reconhecimento que escapa ao questionamento [...] e essa colusão está no princípio de sua competição e de seus conflitos. Eles dispõem de trunfos, isto é, de cartas-mestra cuja força varia segundo o jogo: assim como a força relativa das cartas muda conforme os jogos, assim, a hierarquia das diferentes espécies de capital (econômico, cultural, social, simbólico) varia nos diferentes campos (Bourdieu apud, BONNEWITZ: 61).

O conceito de Campo Social (e sua analogia com os jogos) é o que melhor permite entender a interação atual entre a mídia e a política, campos que se guiam por lógicas diferentes, mas que passaram interferir um no outro. Bourdieu tratou – de forma superficial e preconceituosa, diga-se de passagem - do impacto do jornalismo sobre os campos político e acadêmico, no polêmico livro Sobre a televisão (1997). Tratava-se de uma (tentativa de) defesa da autonomia desses campos sociais contra sua midiatização. É um texto militante que deixa em aberto à exploração analítica de vários pontos.

Sugere-se aqui outro modelo: observar a intercessão, a autonomia e reciprocidade entre os campos da mídia e o campo da política. O campo político é o lugar em que se geram, na disputa entre os agentes que nele se acham envolvidos, produtos políticos, problemas, programas, análises, comentários, conceitos e eventos, entre os quais os cidadãos comuns são chamadas a debater e decidir, durante as eleições. É, portanto, um campo fechado (em que seus agentes internos interagem na maioria do tempo), que se abre sazonalmente a todos, durante os breves momentos eleitorais.

O Campo da Mídia é o ambiente de visibilidade simultânea, que funciona segundo suas próprias regras e subverte a lógica de premiação de outros campos. A mídia ocupa uma dupla posição em relação à estrutura social, ela é tanto um Campo próprio (em que os atores sociais debatem seus problemas) como também um agente no Campo Político mais geral.

Graças a essa ambiguidade funcional, os meios de comunicação são 'meta jogadores', que 'bancam' a democracia. Os meios de comunicação são instituições políticas de mediação das elites com o público, mas não substituem os governos, os parlamentos, os partidos e os demais atores políticos - apenas se sobrepõem a eles, 'dando as cartas do jogo', selecionando e interpretando todas as informações de um campo para os outros. O resultado imediato dessa ambiguidade institucional é que, enquanto há abordagens midiafóbicas, que enfatizam o aspecto negativo das mudanças, ressaltando o campo social como o conjunto da esfera pública e a mídia como um agente social nefasto; outras, midiafílicas, percebem apenas o aspecto positivo, enfatizando a mídia como um campo aberto para o diálogo direto entre os agentes políticos e o público.

A maioria dos autores contemporâneos postula uma posição intermediária: os campos da Política e da Comunicação se interpenetram numa relação recíproca, mais ambos preservam suas especificidades; nem a política se dilui frente ao efeito da mídia, nem a mídia é um mero instrumento da política ou alienação social.

O discurso político atual realmente se organiza pela gramática específica da linguagem da mídia, com ênfase na novidade, no inusitado e em padrões estéticos. O marketing adapta o discurso político às preferências do público através de pesquisas e se baseia na similitude entre audiência e eleitorado (ou entre a opinião pública e o mercado consumidor). E não se trata apenas do discurso político (mediado), mas a política entendida como prática social passou a se orientar parcialmente pela lógica da visibilidade midiática e de seu capital simbólico.

Observando a inter-relação entre os dois campos podem-se localizar vários elementos: a) o que há de político na comunicação (o subcampo jornalístico); b) o que há de comunicação na política (a imagem pública e a propaganda política); c) o que há na política que não está na comunicação (a negociação invisível); d) o que há na comunicação que não está no campo político (o simbolismo aparentemente apolítico do mundo do entretenimento).

Pode-se dizer, no entanto, que os campos da comunicação e da política estão em convergência, que sua intercessão está aumentando ('a implosão da esfera pública' prevista por Habermas) e que as áreas em que os campos mantem sua própria lógica tendem a diminuir (com a transparência virtual das negociações hoje invisíveis e com a 'politização' de celebridades, atletas e artistas). Vários autores contemporâneos chamam essa convergência de 'espetacularização da política' e consideram que a política tornou-se mais teatral.

Porém, a convergência entre os campos da comunicação e da política são ainda insuficientes para explicar o fenômeno da gamificação da democracia, surgindo a necessidade “de um terceiro convidado”: o mundo dos negócios (GOMES, 2004 p. 129).

Essa ampliação sociológica extrapola o âmbito da perspectiva discursiva, permitindo um ângulo mais abrangente por um lado. E, por outro, o mercado é quem gamifica a esfera pública e a sociedade civil, investindo na competição de seus agentes. O jogo social é travado em três campos: o econômico, o político e o psicocultural. E a interação convergente entre os campos da mídia, da economia e da política, assim, reorganiza os elementos internos e promove a gamificação social.